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Ensaio sobre a lucidez

Há muito que entraram no nosso léxico expressões que figuram em cartazes grafitados, que ilustram a revolta popular nas praças públicas nacionais, e que com criatividade gerem a palavra “troika” como um verdadeiro adjetivo da língua portuguesa. “Que se lixe a troika” é, de todas as expressões, a mais convicta: nasceu como um qualquer insulto, aquando da preparação de um qualquer cartaz, para uma qualquer manifestação pseudo-apartidária e, de repente, denomina um movimento, também ele pseudo-apartidário. 

Ora, tal expressão curiosa propagou-se como um hino nacional, um slogan de autodeterminação que se repete com orgulho, o mesmo orgulho com que se referem outros símbolos nacionais. Curioso, ainda mais, é o entendimento que lhe está subjacente – “que se lixe a troika” é um manifesto sinónimo de “que se lixe o discernimento” ou mais efusivamente, “que se lixe quem nos empresta dinheiro para sobrevivermos”. 

Mas tais interpretações exigiriam um esforço acrescido de raciocínio. Podemos tentar ajudar: a troika equivale a três entidades que acordaram em emprestar dinheiro a Portugal, para que no final de cada mês, o Estado tenha condições para pagar a dívida que tem a terceiros, os salários da Função Pública, as pensões, os subsídios, a saúde, a educação, a justiça, e toda a nossa organização profundamente cara. Esse lobo mau que patrocina as nossas exigências sociais, exige em troca seriedade nas contas públicas, diminuição da despesa e cortes nas “gorduras do estado”. Portanto, para além de nos emprestar dinheiro, ainda nos dá educação. 

Existem outras interpretações curiosas que escorrem do dito slogan. Os senhores que orgulhosamente ostentam o ilustre cartaz “que se lixe a troika”, talvez sejam os mesmos que exigem o salário da função pública, a pensão, o subsídio, a saúde pública, a educação, a justiça. Os mesmos que dizem que o governo se deve demitir, mas que não têm solução alternativa, ou que avançam com propostas estranhas – democraticamente bizarras – sobre a forma como se deve constituir um novo governo, ignorando os milhões de portugueses que elegeram o PSD para governar. Os mesmos que não abdicam do seu status quo, do individual face ao coletivo, do estado que exigem ter, mas que não querem ou não podem pagar. 

Tais raciocínios lúcidos, ainda que chegassem, chegariam tarde. Onde estavam esses ilustres porta-estandartes das frases criativas quando queríamos construir aeroportos, fazer escolas em mármore, distribuir computadores, ou injetar dinheiro dos contribuintes – também deles portanto – em bancos falidos? Depois de expulsarem a troika, de onde pretendem, magicamente, tirar dinheiro para sustentar aquilo de que não abdicam? Os caríssimos manifestantes não estão isolados, felizmente. As mesmas questões assolam semelhantes lugares-comuns dos partidos de esquerda em Portugal. 

Que se lixem os que nos fizeram precisar da troika. Era um raciocínio inteligente, mas não vende cartazes.

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